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Tudo está associado à recuperação da consciência e do autocontrole, devolvendo ao paciente o potencial,
primeiro, de enxergar e perceber a sua real situação,
liberando a mente da abstinência para obter um pleno julgamento entre certo e errado e proporcionar o gerenciamento próprio de suas decisões.
A maioria dos casos que levam a internações, envolve a destruição da percepção da realidade, da autocrítica e discernimento moral por parte do paciente.
Esta situação leva à adoção de caminhos voluntários ou involuntários para a internação, dependendo do grau de evolução desta destruição pessoal provocada pela dependência e consumo.
O processo envolve diversas especialidades, o que define a sua condição de multifuncional, pois é preciso a união de diversas vertentes de conhecimento e experiência para lidar com as drogas e, principalmente, com a sua ausência, já que a abstinência, é o primeiro e mais poderoso inimigo a ser vencido.
Abstinência e compulsão:
Estamos lidando com um processo muito profundo na mente do dependente, pois o consumo frequente de drogas, envolvendo substâncias cada vez mais poderosas, provoca alterações na estrutura natural, física e química do corpo, principalmente do cérebro, e principalmente também, na sua região mais nobre.
Simplificadamente, o que nós dá a sensação de prazer e felicidade, são os conhecidos neurotransmissores, como dopamina, serotonina, noradrenalina, endorfina, dentre tantas outras substâncias, que são descarregadas pelo conjunto cerebral, na medida das percepções naturais da pessoa, em relação aos momentos e situações que experimenta na vida.
Um encontro com uma pessoa muito querida, faz com que o cérebro derrame uma certa quantidade equilibrada de um certo neurotransmissor em sua corrente neural, dando aquela sensação de alegria.
Ganhar um prêmio numa loteria, pode ampliar a intensidade da felicidade, e o tamanho do motivo, faz com que o cérebro derrame uma quantidade maior ainda desta substância, aumentando os níveis de alegria, chegando à euforia.
Este é um exemplo do ciclo normal de funcionamento do mecanismo de satisfação em nosso cérebro.
O consumo de drogas, faz com que estas substâncias psicoativas, induzam o cérebro a despejar quantidades maiores na rede neural, de forma inadvertida, descontrolada e sem motivos reais, apenas por indução química.
O cérebro é uma “máquina de aprender” perfeita, e não é preciso muitas ações de consumo de drogas, para que ele perca a regulagem, parando de produzir e jogar as substâncias de felicidade e alegria, ou fazendo com que as doses sejam insuficiente, se comparado com o alto fluxo que as poderosas drogas provocam.
O resultado, é o aumento da sensação de depressão, tristeza, frustração e desânimo.
Para o dependente, esta sensação ruim só passa, se ele consumir drogas.
Como o cérebro é tão perfeito, que ele possui um mecanismo próprio de resistência, o consumo simples também deixa de fazer efeito, e a busca passa a ser por doses maiores e drogas cada vez mais poderosas, estabelecendo o ciclo vicioso que leva à autodestruição, num caminho sem volta.
A abstinência acontece quando o corpo é privado da substância, que não envolve apenas o processo depressivo, já que uma conjuntura química se estabeleceu a partir do consumo desenfreado de drogas.
O corpo reclama através de diversos sintomas bruscos e radicais da abstinência.
Crises horríveis de abstinência estão presentes na primeira fase do tratamento da maioria das drogas pesadas.
O acompanhamento completo e total é primordial nesta fase, e insubstituível, pois a droga, durante seu consumo, se estabelece como compulsão, o que foge completamente a qualquer tipo de controle por parte do indivíduo, o que requer que ele seja cerceado de suas liberdades, até que vença esta primeira e mais difícil etapa do desafio.
A intensidade das crises de abstinência:
Abstinência varia em proporção e intensidade, dependendo de diversos fatores, a maioria, subjetivos, como o perfil do paciente, suas características orgânicas e psicológicas, o tipo de drogas aos quais se submeteu, o tempo de exposição, dentre outros tantos.
Cada caso é um caso.
A heroína é um dos mais poderosos alcaloides, e provoca uma das mais intensas crises de abstinência, que vai da fissura descontrolada pelo consumo, descompasso a descontrole neurológico generalizado, tremores, suor abundante ao mesmo tempo que o paciente é acometido por violenta sensação de frio, total falta de controle sobre os movimentos, contrações, espasmos, dores, febre, um grande número de importantes sintomas físicos muito desagradáveis e intensos.
Psicologicamente, as crises de ansiedade e pânico são constantes, acompanhadas de sensação de morte iminente, desespero, falta de ar, depressão profunda e hiperatividade descontrolada.
A química e os medicamentos na busca pela estabilização:
O desafio, nesta primeira etapa de tratamento, é a busca pela estabilização do paciente para a superação dos transtornos originados pela abstinência e compulsão.
Os compostos químicos, na forma de remédios, são fundamentais para auxiliar o corpo e a mente a se recuperar.
O ponto positivo dentro do cenário horrível da abstinência e compulsão,
é que a grande maioria dos casos podem ser superados, cabendo perfeitamente a analogia de que, depois da tempestade, vem a calmaria.
Os grupos medicamentosos funcionam no controle psíquico e na amenização dos sintomas psicológicos e orgânicos.
O primeiro passo, na maioria dos casos, envolve o “desligamento” do paciente para atravessar a parte mais crítica da abstinência.
Isso costuma ser feito através da sonoterapia induzida, onde uma sequência de sedações,
leva o paciente a dormir, a maior parte do tempo, por 15 a 20 dias.
Alguns momentos de despertar são necessários, para que o paciente não perca o vínculo psicológico com a realidade.
Esta etapa é muito delicada, pois um processo de sonoterapia muito profundo, pode levar o paciente a um estado de ausência da realidade irreversível,
fazendo com que ele perca a maior parte da consciência.
Embora exista este risco, as intercorrências registradas são insignificantes ou quase nulas,
pois os grupos médicos que aplicam este tratamento possuem a consciência da importância de obediência aos protocolos recomendados e os riscos envolvidos.
O trabalho consciente:
Depois de vencida a primeira e mais desafiadora etapa, chegou a vez de trabalhar com a consciência do paciente, e neste ponto,
ele é a parte mais importante do processo de cura.
Pois dependerá exclusivamente dele a sua libertação ou não da dependência de drogas.
Especialistas em terapias psicológicas e psiquiátricas entram em ação,
entretanto em uma verdadeira bateria de tratamento medicamentoso de estabilização,
associados a sessões intensas de terapia, onde o paciente é levado ao reconhecimento de sua situação,
para que ele perceba que, embora sua necessidade aponte para o desejo de consumo de drogas,
contudo aquele caminho é destruidor e não vale a pena.
O trabalho não é feito para que ele apenas diga isto da boca para fora, mas para que ele reconheça isto efetivamente, como uma realidade.
A partir deste ponto, são construídas “armas mentais” para que ele as utilize no seu combate às tentações,
que afinal estarão sempre flutuando diante de suas perspectivas cotidianas.